Juracy Simões da Silva,
conhecida como Juracy de Canindé, exerce o cargo de presidenta da Tribo Canindé
do Recife. Cursou o antigo curso pedagógico e também fez contabilidade, passou
no vestibular em uma universidade privada, mas nos conta que seus pais não
puderam fazer esse investimento em seus estudos:
Éramos
pobres, pobres, pobres. Trabalhei nos Correios por 10 anos mais chegou o
momento de escolher entre trabalho ou cuidar do meu pai e preferi cuidar dele.
E hoje é que não trabalho mesmo, porque o Canindé toma todo meu tempo.
Foliã nata, ela conta que foi “gerada,
nascida e criada dentro do Canindé”. Seu pai, Severino Batista da Silvam era o
presidente da agremiação. Quando ele faleceu, em 1994, Juracy foi a primeira
mulher a ocupar esse cargo em uma agremiação dessa categoria.
A tribo Canindé foi fundada em 1896 e
era composta apenas por homens. No entanto, segundo Juracy, na gestão de seu
pai já havia mulheres na diretoria e ela, mesmo sem ter conhecimento do
assunto, foi sendo preparada para o cargo que ocupa.
Juracy deu novo impulso
às atividades do grupo e maior visibilidade à agremiação. Organizou-a
jurídicamente e estabilizou a situação financeira. “Eu me aperrei muito, chorei
muito, mas resolvi me regularizar”, diz. Além disso, criou um acervo histórico,
renovou o figurino e conquistou por nove vezes consecutivas o campeonato no
concurso do carnaval do Recife. Em 2009, Canindé foi reconhecida como
patrimônio vivo de Pernambuco. Ela assim descreve sua atuação à frente da
agremiação:
Hoje
eu faço tudo, terminou o carnaval eu já faço uma sinopse e já fico matutando o
que vamos fazer pro próximo carnaval. Até nas cores eu penso, só que eu começo
a articular isso comigo mesma e só passo à frente quando tenho certeza. Também
sou muito determinada, aí só depois que decido, chamo minha equipe pra
trabalhar, eu tenho uma equipe onde existem mais mulheres que homens. Sou muito
exigente... agora estou até mais maleável porque o jovem predomina muito e como
o Canindé é todo jovem, sou muito paciente com eles, é difícil eu ficar
impaciente. Já sabem como distribuir, eu não tenho que ficar encarnando, acho
que todo mundo sabe seu papel e como não gosto de palpitem evito ficar dando.
O aspecto religioso é fundamental na Tribo
Canindé. A agremiação é vinculada ao Candomblé e a tradição é mantida
hereditariamente por Juracy, segundo explica:
A
religiosidade em Canindé qualquer um percebe, é muito evidente. Tem a
religiosidade dos mestres, que foi de meu passado e eu tenho respeito e muita
admiração. Tem o mestre de vovó, tem o mestre do meu padrinho que era juremeiro
e também era do Candomblé. Tem a cabocla dele, tem a Oxum da Casa, tem o Xangô
da Casa que eu tenho uma empolgação muito grande... Então, tem Deus que o
Todo-Poderoso, ele que rege tudo, e as entidades espirituais, que tem uma
ligação muito forte.
Após ter superado vários problemas, hoje
revigorada, Juracy reconhece que são muitos os limites que enfrenta, inclusive
do ponto de vista amoroso. “Depois que me tornei presidenta, não me liguei mais
a ninguém, não quis saber de nenhum relacionamento duradouro... Eu fui muito
mal-amada. Quem me ama hoje é Deus, Canindé e os Orixás”. Mas não desanima:
“Tudo o que eu faço é gostoso, Canindé, as roupas, os ensaios, essas coisas
todas preencheram a minha vida”.
Fonte: SILVA,
Claudilene. SOUZA, Ester Monteiro da. Sem
elas não haveria carnaval: mulheres do carnaval do Recife. Recife: Fundação
de Cultura da Cidade do Recife, 2011. p 72